Das desavenças entre nora e sogra à prisão da suspeita: veja linha do tempo do caso de bolo envenenado

Três mulheres da mesma família morreram após comer um bolo envenenado com arsênio em Torres, no Litoral Norte do RS. A idosa que preparou o alimento comeu duas fatias e segue hospitalizada. A nora dela está presa e é investigada por suspeita de triplo homicídio e de três tentativas de homicídio.

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A fonte da contaminação por arsênio foi a farinha usada para fazer o alimento consumido pelas vítimas no final do ano passado, conforme o IGP.

O g1 teve acesso aos depoimentos prestados à Polícia Civil, obtidos pelos repórteres Adriana Irion e Humberto Trezzi, do jornal Zero Hora, e elaborou uma linha do tempo que retoma a relação entre as vítimas e a suspeita e os principais acontecimentos do caso.

Conforme relato de Deise Moura dos Anjos aos investigadores, ela e o filho de Zeli mantinham uma conta conjunta. A sogra teria pegado o cartão bancário e feito um saque, no valor de R$ 600, sem o conhecimento do casal.

Deise contou que Zeli teria pedido desculpas para ela, porém, “a relação nunca mais foi a mesma, pois não havia mais confiança”.

Agosto de 2024: com o marido e o filho, Deise faz visita a sogra

Na tarde de 31 de agosto do ano passado, Deise afirma que ela e a família foram para Arroio do Sal, pois o filho dela queria ver os avós.

Antes de chegarem ao destino, conforme o depoimento, eles passaram na casa de Zeli, em Canoas, e pegaram produtos de limpeza, flores, leite em pó, ovos, farinha e bananas.

Setembro de 2024: Zeli passa mal, e marido dela morre

No dia 2 de setembro, Zeli e o marido, Paulo, passaram mal. Eles teriam tido o mal-estar depois de tomar café com o leite em pó e comer as bananas trazidas por Deise e o marido.

Zeli e o companheiro foram encaminhados para o Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, de Torres. Paulo morreu na madrugada de 3 de setembro. A certidão de óbito aponta infecção intestinal como um das causas da morte.

Novembro de 2024: Deise pesquisa por veneno na casa de Zeli

Conforme os registros policiais, Deise pesquisou por “veneno para o coração” e “veneno para humanos”, no dia 18 daquele mês, enquanto estava na casa de Zeli. A alegação é que ela queria entender possíveis causas para a morte de Paulo.

“Ora, há fundadas razões, de acordo com as provas coletadas, que Deise foi na residência de Zeli e possivelmente envenenou algum ingrediente que seria utilizado pela Zeli”, diz o delegado responsável pelo caso, Marcos Vinícius Veloso.

No dia 23 de dezembro, a família passou mal após comer o bolo levado por Zeli para a confraternização de fim de ano. Após serem hospitalizadas, morreram Maida Berenice Flores da Silva e Neuza Denize Silva dos Anjos, irmãs de Zeli, e Tatiana Denize Silva dos Santos, sobrinha da idosa.

De acordo com a Polícia Civil, Zeli fez o bolo e comeu duas fatias. Ela permanece hospitalizada.

Após o caso, a Polícia Civil informou que vai pedir a exumação do corpo do ex-marido de Zeli. A morte de Paulo não foi investigada, inicialmente, por não ter sido tratada como crime.

“Como tivemos ciência hoje desse fato, instauramos um inquérito policial e vamos exumar o corpo deste senhor para verificar se houve envenenamento também”, explicou o delegado Marcos Vinícius Veloso à época.

No dia 27, os resultados das primeiras análises laboratoriais, coletadas pelo Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, indicaram presença de arsênio no sangue de uma das vítimas e dos dois sobreviventes (Zeli e o sobrinho-neto dela, filho de Tatiana).

“O próprio hospital levou o material para o Centro de Informação Toxicológica. Nesse centro, foi constatado arsênio no sangue de duas vítimas que sobreviveram, que estão no hospital ainda, e de uma mulher que morreu, a dona Neuza”, explicou o delegado Marcos Vinícius.

A criança de 10 anos que comeu o bolo com a família em Torres recebeu alta do Hospital Nossa Senhora dos Navegantes no dia 3 deste mês. O menino estava internado desde a véspera do Natal e chegou a ficar na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

A criança perdeu a mãe, Tatiana Denize Silva dos Anjos, a avó, Neuza Denize Silva dos Anjos, e a tia-avó e madrinha, Maida Berenice Flores da Silva.

A nora de Zeli foi presa no domingo (5) por suspeita de envenenar o bolo. Deise Moura dos Anjos foi conduzida para a Delegacia de Polícia e está recolhida no Presídio Estadual Feminino de Torres.

Segundo a polícia, a mulher teve prisão temporária decretada por suspeita de triplo homicídio duplamente qualificado por motivo fútil e com emprego de veneno e três tentativas de homicídio duplamente qualificado.

Deise passou por audiência de custódia, e a Justiça decidiu que ela permanecerá presa por 30 dias.

A Polícia Civil e o Instituto-Geral de Perícias (IGP) confirmaram, em entrevista coletiva na segunda-feira (6), que envenenamento por arsênio foi a causa das mortes das três pessoas após comerem o bolo.

De acordo com Marguet Mittman, diretora do IGP, a fonte da contaminação foi a farinha usada para fazer o doce consumido pelas vítimas.

“Foram identificadas concentrações altíssimas de arsênio nas três vítimas, tão elevadas que são tóxicas e letais. Para se ter ideia, 35 microgramas já são suficientes para causar a morte de uma pessoa. Em uma das vítimas, havia concentração 350 vezes maior”, diz Marguet.

O que é arsênio

Conforme André Valle de Bairros, professor de Toxicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), o arsênio é o elemento químico, enquanto arsênico é denominado para o composto trióxido de arsênio.

“O arsênico trata-se da forma mais tóxica. A partir de 100 mg é possível a morte de um indivíduo adulto. Geralmente, o arsênico está na forma de pó e não tem cheiro ou gosto. Apesar de ter sido usado como raticida, esta droga pode ser empregada para fins de tratamento oncológico em pacientes com leucemia promielocítica aguda e é comercializada como Trisenox”, explica o especialista.

“O arsênico trata-se da forma mais tóxica. A partir de 100 mg é possível a morte de um indivíduo adulto. Geralmente, o arsênico está na forma de pó e não tem cheiro ou gosto. Apesar de ter sido usado como raticida, esta droga pode ser empregada para fins de tratamento oncológico em pacientes com leucemia promielocítica aguda e é comercializada como Trisenox”, explica o especialista.

Bairros assinala que arsênico é proibido de ser comercializado no Brasil como raticida e o uso como agente quimioterápico é restrito.

“O arsênio é um elemento de alta toxicidade conhecida pela humanidade e sempre houve um certo temor. Há locais no globo terrestre ricos em arsênio, e isso contamina fontes de água. Mas é algo que precisa ser muito investigado. Há literatura científica, e de fato, há essa contaminação em leite, carne e frutas, porém, o fato de estar expostos a concentrações maiores de arsênio não significa necessariamente uma intoxicação”, acrescenta.

Nota da defesa de Deise

O escritório Cassyus Pontes Advocacia representa a defesa de Deise Moura dos Anjos no inquérito em andamento sobre o fato do Bolo, na Comarca de Torres, tendo sido decretada no domingo a prisão temporária da investigada.

Todavia, até o momento, mesmo com o pedido da Defesa deferido pelo judiciário, ainda não houve o acesso ao inquérito judicial.

A família, desde o início, colabora da investigação, inclusive o com depoimento de Deise em delegacia, anterior ao decreto prisional.

Cumpre salientar, que as prisões temporárias possuem caráter investigativo, de coleta de provas, logo ainda restam diversos questionamentos e respostas em aberto neste caso, os quais não foram definidos ou esclarecidos no inquérito.

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